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Tércio de Vina
Edições El Pep, 2010
82 págs., tetracromia
"Uma pitada de mestria operária das Caldas com o nonsense de "Monty Python": assim se define "Março Anormal."" ou assim o define Nuno Duarte numa das abas da capa.
Escrito e desenhado por João Tércio de Vinagre Guimarães, aliás, Tércio de Vina, o livro está dividido em 3 actos, cada um protagonizado por uma das 3 personagens cujas histórias acabam por se entrecruzar progressivamente.
No primeiro acto acompanhamos Marco Manias que após um encontro sexual menos feliz, desenvolve uma infecção que o deforma de maneira muito particular.
Tal qual Gregor Samsa se depara com a sua metamorfose ao despertar, Marco descobre que possui agora um falo de dimensões sobre-humanas que o fará alvo de exploração num negócio obscuro de cosmética.
Frederico Simões, vulgo Freakin Fred, para além de ser capa do livro, é actor de "artes performativas alternativas" com formação circense, insensível à dor e autor de um massacre pelo qual é finalmente confrontado no segundo acto, encontra Marco após a sua fuga para uma floresta, sendo salvo pela sua "coisa" de um javali devorador de carne.
No acto final é-nos apresentado Óstro, típico herói musculado, acéfalo, ídolo da populaça e pai da jovem Josefina, transmissora da infecção transmutadora a Marco. É na sua senda por vingança, em defesa da honra da sua filha, que são reunidas todas as personagens e temos uma resolução para as suas narrativas.
O livro encontra-se pejado de referências à pop culture - o jogo Mortal Kombat ("Come over here!", pág. 23); Ferrero Rocher (o Ambrósio); Rambo (Óstro); o filme A Few Good Men ("O papá quer a verdade? O papá não agueeenta a verdade", pág. 73); Astérix (o banquete na última página) e uma ou duas letras musicais para ambiente - e, infelizmente, também de erros ortográficos e (dois) erros na balonagem. Se as primeiras fazem com o leitor sinta que a obra pertença a um universo maior, os segundos fazem com que, eu pessoalmente, esboce um esgar de dor.
Concordo parcialmente com Nuno Duarte, a pitada de Caldas está cá, o absurdo inteligente dos Monty Python é que não.
Há muito por onde o autor podia pegar em termos de crítica social e sinto que nesses termos é um livro desaproveitado.
Mas nem só de mal vive o livro.
Em termos visuais é muito bom, um estilo de desenho com um piscar de olhos a Laerte, a coloração impecável (de Rui Lacas e Ricardo Tércio), as sequências excelentes de vinhetas (como exemplos as páginas 47 e 67). Razões que me fazem ainda mais difícil aceitar que foi uma leitura que me decepcionou.
A título de curiosidade, ao contrário de outra crítica não creio que o título do livro provenha de Marco, que após a sua transformação física passa a ser um "Marco anormal" - embora seja bem pensado - mas antes pela referência na primeira vinheta do terceiro acto que contextualiza a acção no tempo.
O tempo anormal no qual vivemos.
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